Será que o propósito que você tanto busca é uma resposta do céu… ou só uma tentativa de provar para a terra que você vale alguma coisa?
A alma humana anseia por sentido. Ainda que para encontrá-lo ela precise vasculhar as lixeiras do mundo. Esse é um fato. Desde o Éden, quando o homem foi desconectado da fonte, algo dentro de nós passou a clamar por direção, identidade e razão de existir. Não basta viver, queremos viver por algo. Mas o que deveria ser uma busca sagrada se tornou, para muitos, uma prisão disfarçada de espiritualidade.
Vivemos numa geração que fala sobre “propósito” com tanta frequência quanto respira. No mundo corporativo, nas redes sociais, nos púlpitos, em músicas, livros e slogans, ouvimos frases como: “Encontre seu propósito e nunca mais trabalhará um dia sequer.” Ou: “Seu propósito vai te fazer conhecido.” Ou ainda: “Deus vai te levantar com poder para cumprir o seu grande chamado.” A intenção até pode ser boa, mas o resultado, muitas vezes, é devastador.
Dito isso, nos vemos em um coliseu, não o de Roma, mas o de narrativas, onde somos devorados por pregações idiotas, palestras vazias e postagens superficiais, que às vezes acaba nos convencendo simplesmente porque quem está transmitindo têm um estereótipo que o mundo ou o seu subconsciente aprova.
Veja bem: o problema não é falar de propósito. O problema é o que foi apresentado como significado de propósito.
O mundo e, tristemente, parte da igreja, passou a vender a ideia de que propósito tem a ver com visibilidade, performance, reconhecimento e resultado.
O porquê? Vende bem, movimenta o mercado, enriquece os falsos mestres que vendem uma identidade misturada com a fé, baseada nas narrativas mundanas.
O propósito virou sinônimo de “grande feito”. Como se só estivesse vivendo o propósito quem está em um palco, liderando uma multidão, empreendendo com sucesso ou evangelizando no mundo todo. E o resultado disso é simples, como a maioria de nós somos comedores de arroz e feijão, não estamos conseguindo pintar a vida que admiramos das redes sociais, pelo contrário, às vezes estamos lidando com o que poderia ser mais próximo do inferno, nos sentimos fora do propósito, atrasados, menores.
Quantas vezes você já olhou para alguém “bem-sucedido” e pensou: “Eu queria ter a clareza de propósito que essa pessoa tem.”
Ou: “Deus, quando é que eu vou viver o meu propósito?”
Se esse tipo de pensamento já ecoou na sua mente, aceite, você estava preso nesse covil de narrativas malignas que roubam a esperança do evangelho do coração humano.
Mas espera... começar? Quem disse que o propósito começa quando você é notado? Quem disse que ele depende de impacto visível? Quem nos convenceu de que “propósito” é algo grandioso, com cara de plataforma, voz de autoridade e resultados públicos?
Essa visão deformada do propósito gera sintomas profundos na alma:
Ansiedade, porque você sente que está sempre atrasado.
Frustração, porque nada parece ser “grande o bastante”.
Comparação, porque o que você faz nunca parece impressionar tanto quanto o que o outro faz.
Sentimento de inadequação, porque você começa a pensar que Deus tem “algo especial” para os outros, mas não para você.
E isso... isso não é evangelho. Isso é opressão disfarçada de chamado.
É por isso que a pergunta precisa ser feita, com coragem, com humildade, com fome de verdade:
Será que o que entendemos por propósito... é mesmo o propósito de Deus?
E se o que você chama de “propósito” for só a sua ferida tentando ser útil?
Será que o “destino” que tanto procuro não é, na verdade, um desdobramento natural de uma identidade que ainda não entendi?
O evangelho não nos convida a fazer coisas grandiosas para sermos relevantes.
O evangelho nos chama a viver de forma tão profundamente unida a Cristo que tudo o que fizermos, em qualquer lugar e em qualquer intensidade, manifeste a Sua glória.
“Porque Dele, por Ele e para Ele são todas as coisas.” (Romanos 11:36)
Essa é a crise da nossa geração: confundimos propósito com exposição.
Confundimos destino com visibilidade. Confundimos chamado com sucesso.
O DISFARCE PERIGOSO DA REJEIÇÃO: PROPÓSITO
Nem toda fome é errada. Nem todo desejo é pecado.
Essa sede por propósito que existe é real e legítima. Ela foi plantada por Deus. Fomos criados com a eternidade no coração, é natural, até espiritual, buscarmos sentido, direção e razão para nossa existência. Mas aqui está o problema: quando essa fome é direcionada para o lugar errado, ela deixa de ser fonte de inspiração e passa a ser fonte de aflição. Quando o desejo de propósito é empurrado para cima de feridas não curadas, traumas não identificados, ele se torna uma forma disfarçada de idolatria.
Em outras palavras: o desejo por propósito é verdadeiro, mas muitas vezes está desconectado da verdade do evangelho.
É desconexo porque, ao invés de buscarmos o propósito como uma extensão da nossa comunhão com Deus, começamos a enxergá-lo como um remédio para a dor que carregamos. Esperamos que o “nosso propósito” resolva sentimentos que ainda não foram tratados: rejeições antigas, traumas familiares, inseguranças não verbalizadas, medos que habitam o porão da alma. E assim, sem perceber, transformamos o propósito em uma muleta emocional. Ele deixa de ser uma fonte de convicções e passa a ser uma tentativa desesperada de se sentir uma pessoa suficiente.
Quantas vezes você já pensou, mesmo que inconscientemente:
“Quando eu estiver vivendo meu propósito, aí sim vou me sentir realizado.”
“Quando eu descobrir o que nasci para fazer, vou me sentir inteiro.”
“Quando Deus me levantar, as pessoas vão me respeitar, me ouvir, me valorizar.”
Consegue enxergar? Por trás da busca por propósito pode existir um pedido não resolvido por aceitação.
A alma, ferida pela rejeição, começa a enxergar o propósito como o caminho para ser finalmente vista e validada. Eu vivi isso, quando inconscientemente ambicionei um ministério esclesiastico de sucesso, na tentativa de tapar um buraco existencial gigantesco dentro de mim.
Mas isso não é propósito. Se parece mais com ansiedade mascarada de fé.
E isso explica por que tanta gente está frustrada mesmo depois de “encontrar” o seu chamado. Porque achavam que, ao realizarem certas coisas, finalmente se sentiriam em paz consigo mesmas. Mas realizar sem estar curado apenas aprofunda o buraco.
Você pode ter um ministério e ainda se sentir inseguro.
Pode ter uma carreira brilhante e ainda carregar vergonha.
Pode ter seguidores, títulos, plataformas, e ainda sentir que falta algo.
Por quê?
Porque você colocou no “propósito” o peso que só Deus pode sustentar.
Esperou que o fazer te desse aquilo que só o ser pode dar.
Buscou nas obras o que só a identidade pode sustentar.
A verdade é: nenhum propósito externo pode curar um vazio interno.
O que você faz não vai consertar quem você é.
E o que você realiza não vai resolver o que você não tratou.
Esse é o perigo da ambição desordenada: ela parece espiritual, mas nasce da dor.
Ela se veste de frases como “quero impactar vidas”, “quero ser usado por Deus”, “quero viver meu destino”.
Mas, no fundo, ela só está dizendo: “quero ser amado. Quero me sentir importante. Quero provar que tenho valor.”
E Deus, como bom Pai, não vai te dar algo que você vai usar para se esconder dEle.
Ele não vai te entregar um “propósito” que se torne uma caverna para a sua alma.
Ele te ama demais para permitir que você use um suposto chamado para evitar cura.
O problema não é o desejo. O problema é o que você quer que esse propósito supra dentro de você.
E mais uma vez, se questione com honestidade:
“Estou buscando meu propósito como resposta ao amor de Deus ou como caminho para merecer esse amor?”
“Quero viver meu chamado para glorificar a Cristo ou para compensar minhas dores e inseguranças?”
Essa distinção muda tudo. Porque é possível desejar algo bom por uma motivação errada.
Por isso, antes de falarmos sobre o que é o propósito verdadeiro, é necessário pausar.
Respirar.
E deixar que o Espírito revele onde nossa busca por propósito se tornou uma tentativa de autoafirmação.
A ordem no coração precisa ser restaurada.
Porque enquanto tentarmos “usar” o propósito para resolver nossas feridas, estaremos sempre cansados, insatisfeitos e emocionalmente presos.
E não é isso que Deus deseja.
O desejo é legítimo.
Mas o que ele espera suprir dentro de nós... precisa ser exposto, tratado e alinhado.
Só então a jornada pode continuar.
Sem máscaras.
Sem pressa.
Sem muletas.
Apenas com o coração aberto.
Pronto para ser realinhado ao centro.
PROPÓSITO NÃO É CHEGAR EM ALGUM LUGAR, MAS SER TRANSFORMADO EM UMA PESSOA:
A grande virada de consciência começa aqui: o propósito de Deus não é um destino, é uma formação. Essa frase pode parecer simples à primeira vista, mas ela desmantela toda uma construção emocional e espiritual que muitas pessoas carregam por anos: a de que propósito é um ponto a ser alcançado, uma função a ser descoberta ou uma plataforma a ser conquistada.
Mas o evangelho aponta em outra direção.
Deus não está nos preparando para uma posição. Ele está nos moldando a uma imagem.
“Porque os que dantes conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho...”
(Romanos 8:29)
Esse é o ponto de partida da verdadeira compreensão de propósito.
O plano eterno de Deus não é colocar você em um grande lugar, é formar Cristo em você onde quer que você esteja.
A vida cristã não gira em torno do que você faz para Deus, mas do quanto de Cristo é formado em você enquanto você faz o que faz.
Não é sobre abrir uma empresa cristã, pregar em uma cruzada, alcançar milhares com seus dons, embora essas coisas possam acontecer.
É sobre o quanto da sua vida reflete o caráter, o amor e a natureza de Jesus.
Essa mudança de perspectiva é o que Paulo tentou ensinar aos gálatas, quando disse:
“Meus filhos, por quem de novo sofro as dores de parto, até que Cristo seja formado em vós.”
(Gálatas 4:19)
Veja: o clímax da vida espiritual não é o cumprimento de uma missão externa, é o processo interno da formação de Cristo em você. E esse processo não começa quando você “descobre seu propósito”. Ele começa quando você é reconciliado com Deus, e passa a viver não mais para si, mas para Aquele que te amou e se entregou por você.
É por isso que Efésios 1:4 declara que fomos eleitos antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em amor.
Não fomos escolhidos para uma tarefa. Fomos escolhidos para uma transformação.
A tarefa é consequência. A missão é fruto.
Mas o centro da vontade de Deus sempre será a nossa conformação à imagem do Filho.
Antes de Deus pensar em fazer algo através de nós, Ele está comprometido em fazer algo em nós.
E talvez, por isso, a jornada pareça lenta. O caminho pareça obscuro. O “grande propósito” pareça distante.
Mas talvez, e só talvez, isso seja exatamente o que Deus está permitindo…
Porque o que Ele está edificando não é um ministério. É o próprio caráter de Cristo em você.
E essa formação… exige fogo, fé e fidelidade.
Não visibilidade.
Não pressa.
Não palco.
A pergunta não é mais: “O que eu fui chamado para fazer?”
A pergunta passa a ser:
“Quem estou me tornando no processo?”
Porque no fim, essa é a métrica que o Céu está usando.
Agora sem rodeios.
Pare de uma vez por todas de pensar que o “grande propósito de Deus” pra sua vida está relacionado ao que você faz, o sucesso que você tem, as pessoas que você influencia, o dinheiro na sua conta bancária, as empresas que você lidera, ou até mesmo com a miséria e escassez disfarçada de piedade.
Segundo a perspectiva do evangelho, pra Jesus pouco importa o que você faz, se é pescador, escriba, cobrador de imposto, perseguidor de igreja…
Ele não se importa se você é engenheiro, pastor, padre, advogado, empresário, branco, preto, gordo, magro, pobre, rico, escravo ou livre.
A única coisa que o importa é que enquanto você está fazendo o que está fazendo, esteja se tornando mais parecido com Ele.
Não importa se você serve as pessoas com uma bandeja nas mãos, se limpa o chão de uma empresa, se faz faxina, se lidera mil pessoas, se compra, se vende, nada disso importa se Cristo não estiver sendo formado em você.
Propósito para Deus não tem haver com o que você faz, tem haver em quem você está se tornando enquanto você faz o que faz.
Tem pastores que mais se parecem com o diabo do que com Cristo, e tem garis que são a imagem do próprio Jesus na terra. A pergunta é: Quem está vivendo o grande propósito na sua vida? O pastor famoso que faz da igreja o seu grande império, ou o simples gari que acorda todos os dias às 4h da manhã e que transborda do amor de Jesus por onde passa?
Associamos o propósito de acordo com a lógica mundana.
A lógica deste mundo é simples e sedutora: você vale o que você entrega. Se for produtivo, será reconhecido. Se for aplaudido, será respeitado. Se for relevante, será considerado importante. Essa mentalidade, profundamente enraizada na cultura atual, infiltrou-se no meio cristão e corrompeu a nossa visão de propósito. Sem perceber, começamos a medir o cumprimento do chamado pelas mesmas métricas que o mundo usa: visibilidade, números, influência, reconhecimento.
Aos poucos, fomos ensinados que viver o propósito de Deus significa “alcançar o lugar de destaque”, “ser usado poderosamente”, “impactar multidões”. E quando essas coisas não acontecem, muitos se sentem pequenos, atrasados, esquecidos por Deus. O evangelho passou a ser confundido com performance. Os dons passaram a ser validados por resultados, e não por transformação de caráter. E isso… adoece a alma.
Você pode estar vivendo sua verdadeira vocação e ainda assim não ser aplaudido, como o próprio apóstolo Paulo, que seguia para o alvo da sua vocação, mesmo estando na prisão.
Você pode estar no centro da vontade de Deus lavando os pés de alguém em silêncio. Pode estar cumprindo o plano eterno no anonimato, no serviço, no secreto. Porque propósito não é lugar de fama, é fidelidade a uma pessoa.
Você não precisa de um palco para viver seu propósito.
Você só precisa revelar Cristo, no lar, no trabalho, na dor, no trânsito, na conversa.
Quando o propósito é redimido pela cruz, ele deixa de ser um projeto de carreira e se torna uma missão de encarnação. Cristo em mim. Cristo através de mim. Isso é propósito. Todo o resto é vitrine.
CRISTO EM NÓS, A ESPERANÇA DA GLÓRIA:
Propósito é Cristo em mim, e isso já é vitória.
Leia de novo. Em voz alta. Como quem rasga uma sentença do céu contra toda acusação silenciosa que a alma tem engolido por anos.
Cristo em mim. Isso já é propósito. Isso já é vitória.
Você não precisa ser famoso. Não precisa estar no “lugar certo”. Não precisa ter seguidores, nem um cargo, nem uma agenda cheia.
Se Cristo está sendo formado em você, você já está vivendo o propósito eterno de Deus, mesmo que ninguém esteja vendo.
“Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam, dos que foram chamados de acordo com o seu propósito. Pois aqueles que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos.” Romanos 8:28-29
Leia o texto acima de novo, e veja que o propósito de Deus mencionado no verso 28 é revelado em seguida no verso 29.
E se isso parece pouco... é porque você ainda está contaminado.
Contaminado por um sistema que te ensinou a medir propósito com régua de desempenho.
Que te ensinou que “ser usado por Deus” é aparecer.
Que confundiu “ser transformado por Deus” com “ser promovido por Deus”.
Mas Deus não veio te promover, Ele veio te possuir.
Essa verdade faz cessar a caçada por dignidade e reconhecimento. Te arranca da roda de hamster, e te coloca no caminho da verdadeira liberdade.
Você pode ser gari, mãe, professor, enfermeiro, CEO, empresário, estagiário ou aposentado.
Você pode estar pregando num estádio ou lavando o chão de um banheiro.
O lugar onde você está não é o que define se você está vivendo o propósito.
O que define é: Cristo está sendo formado e revelado em você?
Porque, veja, o propósito não é o cargo. É o caráter.
Não é o feito. É a formação.
Não é o palco. É o perfume.
E o perfume de Cristo não precisa de microfone, ele exala no silêncio.
A alma que entendeu isso... descansa.
Descansa porque já não precisa provar mais nada.
Já não precisa conquistar para ser validada.
Já não precisa correr atrás de um “destino” que Deus já plantou dentro dela.
Essa é a revolução: o propósito não está lá fora. Está aí dentro.
Ele não começa quando você “chegar lá”.
Ele já começou quando o Espírito Santo entrou e disse: “Agora Eu moro aqui.”
“Cristo em vós, a esperança da glória.” (Colossenses 1:27)
Não Cristo ao seu lado.
Não Cristo no futuro.
Cristo em você. Agora. Presente. Real. Vivo. Eterno.
Você pode estar passando pelo pior momento da sua vida, e ainda assim estar no centro do propósito.
Porque o propósito não te isenta da dor, ele te sustenta nela.
E muitas vezes é justamente no quebrantamento, no silêncio, no anonimato, que Cristo se forma mais profundamente.
Sabe por que isso é libertador?
Porque finalmente você entende: o propósito de Deus é maior do que os seus planos.
Se os seus planos falharem, o propósito permanece.
Se os caminhos mudarem, o propósito segue intacto.
Porque o propósito não é algo que você faz. É algo que você carrega.
Você carrega a glória. Você carrega a imagem. Você carrega o Filho.
E isso já é vitória.
Não porque tudo deu certo.
Mas porque, mesmo quando tudo parecia dar errado, Cristo foi formado.
E no fim das contas, isso é tudo o que importa.
O céu não vai aplaudir o número de seguidores, o faturamento da empresa, o tamanho do ministério.
O céu celebra quando vê o Filho sendo formado em nós.
Você quer saber se está vivendo seu propósito?
Então pare de olhar para fora.
E pergunte: Cristo está sendo formado em mim… hoje?
E sim, Ele está, e a seu tempo se manifestará em Glória…
Então respira fundo.
Você já venceu.